sábado, 10 de abril de 2010

As tragédias e o poder público

As catástrofes ocasionadas pelas chuvas não se constituem em fato novo. Lamentamos o sofrimento das vítimas e de suas famílias, mas lamentamos também a falta de investimentos em projetos preventivos. Lamentamos a atitude de políticos mal intencionados que estimulam a permanência de famílias em áreas de risco para capitalizar votos.

Seria muito importante que fosse criada no país uma nova lei que estabelecesse medidas mais rígidas contra construções em áreas de risco. Lamentamos a irresponsabilidade de imobiliárias que no desejo de aumentar lucros planejam e executam projetos em locais inadequados. Sabem que não podem construir casas nas encostas dos morros e mesmo assim constroem Depois da catástrofe no Rio de Janeiro ouvi algumas pessoas dizendo que um dos problemas dos desabamentos é a insistência das pessoas.

A falta de moradias seguras é um sintoma claro da desigualdade social e da má distribuição de renda. Mas entendo que a questão é estrutural, social e cultural. No Brasil o deficit habitacional é histórico.

A história do Brasil durante muito tempo evitou, mas hoje sabemos que a "libertação tardia da escravatura" não resolveu os problemas. Foram empurrados para os morros quando a Princesa Isabel instituiu a Lei Aurea em 1888. Faz ali porque não tem outras opções. Muitos dos moradores de favelas são descendentes de ex-escravos Ora, pergunte a uma pessoa que mora num morro se era um sonho construir um "barraco" num local tão arriscado?

Os barracos e cortiços das cidades grandes, erguidos principalmente nos morros originaram as favelas como conhecemos hoje. Muitos voltaram às fazendas e casas grandes dos seus algozes pois não tinham para onde ir. das vítimas, os escravos. Ficaram perambulando sem emprego, passando fome, doentes, humilhados e sem moradia.

Quando resolvem partir para a clandestinidade são acusados de irresponsabilidade. Estamos no Século XXI e pessoas continuam sofrendo e morrendo por não terem onde morar Não é apenas de reforma agrária que o país necessita, mas também de uma reforma habitacional que faça justiça focada em fatores históricos. Cito apenas um exemplo da história precária da habitação no Brasil que na maioria das vezes é ignorada por letrados e iletrados.

Significa o início do pagamento de uma dívida histórica com a população renegada pelo "status quo" da sociedade brasileira. Projetos como "Minha Casa Minha Vida" são mais do que obrigação dos governos. São negligências assim que estimulam a ação irresponsável de imobiliárias que oferecem e não cumprem o que prometem quando vendem imóveis.Mas irresponsável também foi o Estado que ao longo dos últimos 200 anos não pensou em ajudar os pobres a ter um lugar decente para morar.
Serviços de água, energia elétrica, esgoto, telefone, pavimentação e habitação devem ser encarados como direitos óbvios dos cidadãos.os governos precisam dotar os espaços urbanos das condições básicas de convivência e sobrevivência.

Só investimentos não resolvem, é verdade, é preciso quebrar paradígmas e mudar a cultura Se as cidades estiverem mais preparadas em termos de infraestrutura para enfrentar as pressões da natureza. Os fenômenos naturais como as chuvas torrenciais são inevitáveis, no entanto os efeitos causados podem ser reduzidos ou evitados Os gestores públicos precisam pensar nas chamadas soluções inteligêntes para as cidades do Século XXI que corrijam as distorções.

Dois exemplos recentes mostraram como as ações governamentais podem ser fundamentais e impactar de forma positiva ou negativa num país. Com as cidades mais preparadas e a população mais consciênte e convicta do exercício da cidadania, os estragos podem ser menores. Conscientizando a população sobre ações preventivas como o simples ato de recolher o lixo das ruas para não entupir bueiros.

Para o problema habitacional no país, especialmente para os mais pobres que acabam sendo vítimas de oportunistas. sem respeitar os limites financeiros das pessoas. O ato irresponsável também atinge os governos norte-americanos que não atentaram. Um dos fatores da crise norte-americana foi a dívida dos mutuários e a irreponsabilidade dos bancos privados que financiaram moradias.

É preciso acabar com as atitudes viciadas de negligência na ocupação do espaço público. Posturas assim devem ser encorajadas e repetidas pelos gestores públicos que precisam pensar as cidades com foco no bem-estar do cidadão. O estrago poderia ser pior se uma série de medidas preventivas do ponto de vista do projeto arquitetônico não tivessem sido tomadas. se mostraram eficiêntes no que diz respeito à segurança das moradias. Apesar dos prejuízos e do número de vítimas Um exemplo mais positivo foi o do Chile. Mesmo com a tragédia dos terremotos as cidades de Concepcion e de Santiago.

Não tem mais graça esse filme hediondo e hipócrita. Com cidades mais bem cuidadas não teremos que lamentar e chorar a morte de inocentes. O que não se pode admitir é só lamentar as tragédias e mortes em todo período de chuvas. Que possibilitem orientar e ajudar aos mais pobres a conquista da casa própria. Afinal essa é uma dívida do Estado no Brasil. Mas criar mecanismos legais de abuso na construção irregular, exige também que os governos sejam justos para corrigir questões estruturais.


J.Menezes
10/04/2010

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