O anúncio feito pela Organização das Nações Unidas é alarmante. Mais de 100 milhões de pessoas sofrerão com a crise de alimentos no mundo. O caso mais emblemático essa semana foi a o aumento do preço do arroz. Três causas são apontadas para a crise: o aumento do preço do petróleo, a especulação no mercado e o aumento da demanda. As pessoas estão comendo mais e a produção de alimentos não está acompanhando o mesmo ritmo. A notícia serve de reflexão não só para regiões com falta de alimentos, mas também para as que produzem como o Vale do São Francisco.
Outro dia falávamos aqui sobre a alta do feijão, produto básico na alimentação dos brasileiros que estava sendo vendido no início do ano a R$ 6 reais. Já há uma crítica em relação aos bio-combustíveis. É que o milho está sendo usado em larga escala nos Estados Unidos para a produção de etanol. No Brasil, um dos trunfos do Governo Lula é usar os "combustíveis limpos" extraídos da mamona, do dendê, da cana de açúcar, entre outros para a produção de etanol.
O líder Cubano Fidel Castro já havia alertado sobre o perigo de ocupar grandes extensões de terra para a produção de combustível em detrimento da falta de alimentos, especialmente nos países mais pobres. Lula tem "sutilmente" rebatido esse discurso. Na última semana disse que a crise é passageira.
Diante desse quadro o que falar do Vale do São Francisco? Hoje a região é considerada "uma fronteira agrícola" no semi-árido nordestino, com uma produção que ajuda a abastecer o consumo interno, (feita pelos pequenos produtores), mas com os olhos voltados para o mercado internacional (grandes produtores). Não estamos falando aqui de grãos, mas de hortifrutigranjeiros. De qualquer forma é alimento do mesmo jeito.
Essa crise deve servir de alerta para que as autoridades governamentais pensem num programa sustentável de desenvolvimento a médio e longo prazos que esteja pautado principalmente na questão social. Ocorre que a visão desenvolvimentista tradicional, via de regra está focada essencialmente no lucro. A lógica puramente mercantilista ignora as necessidades estruturais e o resultado é o que estamos assistindo, crise de alimentos e populações ameaçadas pela fome.
Os economistas já admitem que o neoliberalismo "está cercado" e que o estado vai ter que voltar a interferir na economia para consertar os "erros da ganância" capitalista. Lembram das privatizações? No Vale do São Francisco já é preocupante a falta de políticas públicas no tocante ao "modus operandi" da gestão na agricultura, mesmo reconhecendo que a região mudou muito nos últimos 30 anos.
No final da década de 1960, a prioridade era incentivar a pequena agricultura, possibilitando que os colonos melhorassem as condições de vida de suas famílias, com assistência técnica, apoio creditício e assistência social. Hoje o que se observa é que a maior parte da população dos projetos irrigados consome água sem tratamento (direto dos canais), paga caro pela água utilizada nos lotes irrigados e os núcleos irrigados sofrem com a favelização e com a criminalidade.
É preciso encontrar o equilíbrio no que diz respeito à atenção dada pelos órgãos governamentais aos pequenos e grandes produtores na região. Sem isso de nada vale a "retórica fácil" dos políticos nas páginas e páginas de jornal e matérias de televisão apontando o Vale do São Francisco como "ilha de excelência".
Os "nossos homens públicos" precisam se instruir e acordar. A palavra desenvolvimento hoje tem um outro significado que implica responsabilidade social e respeito às diferenças. Essa retórica valorativa de "paraíso às margens do São Francisco", soa falso e expõe uma temática que merece ser discutida urgentemente. Afinal, que espécie de desenvolvimento estamos construindo no Vale?
J.Menezes
1 comentários:
Matéria brilhante! Extremamente lúcida e coerente.
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