domingo, 16 de março de 2008

A VIA CRUCIS NA CAIXA



O leitor pode estranhar o título, mas foi assim que me senti numa fila da Caixa Econômica Federal, agência de Juazeiro. Na última quinta feira, precisei resolver alguns problemas bancários e procurei a agencia para resolver. Cheguei por volta das 12h05min e claro, como é praxe procurei abastecer-me de uma dose generosa de paciência para suportar a espera na fila. Fui informado por um homem que disse já ser "rato de fila" na caixa que naquele dia estava tudo bem, não tinha tanta gente como na segunda ou sexta quando os clientes e não clientes pagam à metade dos pecados, plantados a espera de atendimento. É uma verdadeira via crucis

Acreditei na informação e procurei de imediato "acender o alerta anti-stress". Fui informado na recepção que para o meu tipo de procedimento era necessário pegar uma ficha e logo a seguir pegar a fila. Assim fiz, seguindo a risca a orientação peguei a de número 157. Ora, sou conhecedor que a Caixa implantou um serviço de marcação antecipada, justamente para evitar excesso de lotação e organizar o serviço. Não fui orientado, mas não sei até o momento porque me deram aquela ficha se eu tinha que pegar a fila do mesmo jeito e esperar a minha vez chegar para finalmente ser atendido.

Confesso que em nenhum momento ouvi a chamada anunciando a minha vez. Senti a minha inteligência e das outras pessoas que estavam na fila subestimadas. Mas paciência vai esperar. De antemão vou logo esclarecendo sem falsa modéstia sempre procuro respeitar a fila, não tenho vocação para "furão". Do lado direito do local onde eu estava tinham dois caixas atendendo a uma fila sempre pequena de idosos, gestantes, lactantes e portadores de deficiência, nada mais do que justo. Bom, entro na fila com a expectativa otimista de sair de lá pelos menos ás 13h30min e assim poder cumprir com os meus outros compromissos do dia. "Uma hora e meia na fila acho que é mais do que razoável" .


Mas aí as horas foram passando, 12h30min, 13h00min, 13h30min, e a fila quase não andava. As reclamações começaram, mas ficavam apenas num lamento repetido e acomodado como acontece em todo o país. Como já havia ficado uma hora na fila, tinha me deslocado direto do trabalho e sem almoçar fui direto para o banco, resolvi sentar um pouco. Tive sorte porque ainda haviam algumas cadeiras vagas nesse momento. Fiquei mais de 40 minutos sentado, enquanto isso resolvi fazer algumas anotações e a fila continuava lá, impassível, teimosa, inerte. Parecia uma ironia em forma de fila.

Quando entrei pela primeira vez deveriam ter mais ou menos umas 35 pessoas, ás 13h00min restava umas 25 e ás 14h30min quando saí da agencia, deveriam ter umas 12 pessoas na fila onde eu estava. Só que a cada minuto que passava, eu sentia a angústia e o desespero nas pessoas. Pálidos, esmorecidos, chateados, suspirando, impacientes, impotentes, como se estivessem diante de um pelotão de fuzilamento. Os caixas, alheios ao que ocorria ali, até porque também impotentes nada podem fazer e até já estão "calejados" com as lamurias do povo. Os estagiários e atendentes aparecem vez por outra tentando organizar a fila numa atitude educada, mas que não resolve.

E é justamente ai que está o "X da questão" quando todo mundo começa a achar que tudo é normal, "que é assim mesmo", que o povo que "se dane", vivemos no Brasil, país do jeitinho, da cultura da razão cínica, da "lei de Gerson". Esse tipo de mau atendimento abre precedentes perigosos para que atitudes de paternalismo ou clientelismo sejam praticados e se transformem numa referencia nacional. Sabe aquela cena do "bacana" ou da madame, chegando sorrateiros e arrogantes e recebidos com tapete vermelho? Seria leviano se dissesse que vi essa cena na Caixa, não vi, abro um parêntesis aqui apenas para esclarecer que somos sabedores que "os pistolões" e as fórmulas mágicas do cortejo e dos privilégios aos influentes acontecem a toda hora nas instituições.

No Brasil, impera ainda a máxima de que "não importam os meios para se chegar a um fim". Continuamos "nivelando tudo por baixo" com esse péssimo costume. É uma cultura miserável, viciada na troca de favores, no tráfico de influência e na individualidade, a tese da "farinha pouca, meu pirão primeiro". Os minutos continuaram passando. As 14h00min horas voltaram para a fila e não vi progresso. Ainda tinha esperanças de que ás 14h30min pudesse estar pelo menos no caixa, enganei-me, faltavam ainda cerca de doze pessoas para serem atendidas. Não suportei, fiz o meu protesto pacífico e equilibrado e saí da fila porque já estava "mareado" de tanto esperar em pé. Ás 14h40min deixei a agência sem resolver minhas demandas bancárias. É abusar demais da paciência das pessoas, ser indiferente as suas necessidades.

Diante dessa situação, fico me perguntando que lógica estapafúrdia é essa que anunciada em alto e bom som que os bancos obtêm lucros astronômicos todos os anos, batendo recorde em cima de recorde e os serviços continuam tão ruins a ponto de se promover um massacre à paciência do povo, estressado e cansado nas filas. Essa lógica é contraditória, autoritária e desleal com o exercício da cidadania. O que está faltando para que os bancos invistam mais em atendimento e conforto para os cidadãos? Dinheiro é óbvio que não é, porque se assim fosse os meios de comunicação não agendariam a pauta anual sobre os altos lucros nos bancos brasileiros. Onde está a tal de responsabilidade social dos bancos? Falta também a fiscalização diuturna dos poderes constituídos para acabar com os abusos.

Já ouvi dizer que o sistema bancário do Brasil é um dos mais eficientes do mundo, pergunto: para quem? É uma tortura que lei nenhuma consegue resolver. O banco do governo federal que deveria dar o exemplo é o primeiro a explorar a paciência e a boa fé do povo. O que mais me deixou revoltado foi o fato da instituição ignorar que naquela fila poderia ter alguém com algum problema de saúde sério que não poderia ficar em pé tanto tempo e ser indiferente ao sofrimento e aos compromissos alheios. Esse tipo de desrespeito não pode ficar impune. É uma ofensa ao cidadão que paga imposto alto e contribui com a saúde financeira das instituições bancárias.

Esse não é só um problema da Caixa, hoje se você quiser resolver um problema nos bancos privados, precisa ficar tentando encontrar um funcionário que esteja em condições de te dar uma resposta atenciosa, mesmo esbaforidos e sobrecarregados pela correria, alguns até se esforçam, mas não é fácil. Definitivamente, o cidadão virou refém dos bancos e escravo do sistema financeiro que só enxerga a sua frente uma coisa óbvia: cifrões. Os cidadãos como sempre, ficam em segundo plano, ignorados pela ganância. Lamentável.

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